As Câmaras de Refúgio, também conhecidas como câmaras de resgate, são abrigos seguros a trabalhadores de mineração em situações de emergência. Em possíveis cenários de emergências em minas subterrâneas, as rotas de fuga ou pontos de encontro podem estar inacessíveis. Além disso, há o potencial de geração de uma atmosfera irrespirável, a partir de um incêndio, emissão de gases tóxicos ou de máquinas e equipamentos em caso de má ventilação. As câmaras de refúgio oferecem aos trabalhadores do subsolo um local temporário e seguro, em pontos estratégicos, até o resgate ou o restabelecimento das condições atmosféricas.
Um dos maiores questionamentos das pessoas envolvidas na segurança do trabalho, em atividades de mineração, é sobre quais são as normas legais aplicáveis às câmaras de refúgio. Embora não haja legislação específica sobre o tema, cabe ressaltar que existem algumas disposições gerais previstas de forma esparsa na legislação de segurança do trabalho na mineração.
A principal norma sobre o tema é a chamada Norma Regulamentadora (NR) nº 22, norma setorial de Segurança do Trabalho na mineração, originalmente editada pela Portaria MTb nº 3.214, de 08 de junho de 1978, sob o título “Trabalhos Subterrâneos”. Até a data de publicação deste texto, 18 de agosto de 2022, a última revisão vigente foi publicada pela Portaria MTb nº 2.037, de 15 de dezembro de 1999, entrando em vigor no dia 21 de abril de 2000, sofrendo ainda algumas alterações pontuais posteriores.
O primeiro ponto a se ressaltar, é que esta norma, em seu item 22.32.1, dispõe que toda mina deverá elaborar, implementar e manter atualizado um Plano de Atendimento a Emergências, comumente conhecido por sua sigla “PAE”, e também estabelece os requisitos e cenários mínimos que este plano deverá conter.
O PAE deverá possuir:
– Identificação dos riscos maiores da mina
– localização dos equipamentos e materiais necessários para as operações de emergência e prestação de primeiros socorros
– definição de sistema de comunicação e sinalização de emergência, abrangendo o ambiente interno e externo e a articulação da empresa com órgãos da defesa civil
– descrição da composição e treinamento periódico das brigadas de emergência, bem como a simulação periódica de situações de salvamento com a mobilização do contingente da mina diretamente afetado pelo evento.
Além disso, deve conter as normas de procedimentos para operações e os procedimentos de operação de brigadas de emergência, nos casos de situações de emergência, em função das características da mina, dos produtos e dos insumos utilizados, considerando no mínimo as situações mais comuns em mineração, como: incêndios, inundações, explosões, desabamentos, paralisação de energia do sistema de ventilação principal da mina, acidentes maiores e rompimento de barragem de mineração, conforme previsto no Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM).
O item 22.32.1 da NR-22 também dispõe em sua alínea “g”, que o Plano de Atendimento de Emergência deve incluir uma definição de áreas e instalações construídas e equipadas para refúgio das pessoas e prestação de primeiros socorros. Desta forma, o PAE precisa descrever quais os locais, seus equipamentos e instalações, dentro do empreendimento mineiro, estarão preparados para abrigar os colaboradores e demais pessoas que trabalham na mina, em caso de emergências.
Cabe ressaltar que tal disposição é aplicável a todas as minas, com previsão expressa no texto legal, que assim o dispõe. Dessa forma, tanto minas a céu aberto, quanto minas subterrâneas devem possuir o mencionado PAE com a definição das áreas e instalações de refúgio.
Previsão similar é repetida em seu item 22.32.4 que dispõe:
22.32.4 Nas minas de subsolo deve existir uma área reservada para refúgio, em caso de emergência, devidamente construída e equipada para abrigar o pessoal e prestação de primeiros socorros
Este item da norma destaca especificamente que as minas subterrâneas devem possuir, em subsolo, um local específico para refúgio em situações de emergência, determinando ainda que este local esteja preparado e devidamente construído e equipado para o abrigo das pessoas e a prestação dos primeiros socorros, quando necessário.
Assim, caberia investigar se há alguma disposição legal que prevê exigências específicas para a construção ou equipamentos mínimos que devem estar previstos nestes locais dentro da mina subterrânea. Esta disposição encontramos no subitem 22.28.4.1 da mesma norma.
Primeiramente, este item define que devem estar disponíveis no subsolo, nas áreas reservadas para refúgio, além de equipamentos de fuga rápida, as chamadas câmaras de refúgio, com capacidade para abrigar os trabalhadores em caso de emergência. O primeiro requisito legal destas câmaras é que sejam incombustíveis. Geralmente com construção em aço e/ou outros materiais resistentes, tanto ao fogo quanto às demais condições subterrâneas, já que o ambiente em subsolo é bastante agressivo e leva à rápida deterioração dos materiais. Eventualmente, possuem possuir outras características construídas específicas como resistência estrutural ou sistemas de isolamento, visando estar preparadas para situações de desabamentos e estresse térmico.
Conforme a previsão normativa, a incombustibilidade deve ser “por tempo mínimo previsto no Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR)”. Sendo assim, é necessário, face aos cenários de emergência que podem se apresentar em cada mina, determinar, conforme cada caso, o tempo de resistência ao fogo que tais abrigos devem possuir. Vale salientar que também é importante definir o tempo máximo de ocupação por pessoa nas câmaras, que é igualmente estabelecido a partir das situações e cenários específicos de cada mina, sobretudo no tempo que será necessário para que uma eventual equipe de resgate chegue à câmara. Dessa forma, se torna importante o planejamento destas situações para a correta previsão do tempo, bem como do posicionamento exato da câmara, podendo inclusive ser adotadas soluções “móveis” que podem acompanhar a expansão da mina e das frentes de trabalho.
Em suas alíneas “a” e “c” o item 22.28.4.1 descreve outras características mínimas que as câmaras de refúgio devem possuir: porta capaz de ser selada hermeticamente e água potável e sistema de ar comprimido. Já a alínea “d” do item item 22.28.4.1 dispõe que as câmaras devem ser facilmente acessíveis e identificadas. A alínea “b” também exige que possua um sistema de comunicação com a superfície, o que está conforme o item 22.18.5 da mesma norma que exigem em sua alínea “l” que as câmaras de refúgio estejam interligadas com os demais setores da mina através de rede telefônica ou outros meios de comunicação, para os casos de emergência. Eventualmente, e a partir da identificação de outras necessidades, as câmaras de fuga podem possuir outros equipamentos, subsistemas ou componentes.
Sempre é oportuno lembrar que as câmaras e seus equipamentos devem ser objeto de inspeção e manutenções preventivas e corretivas, conforme um planejamento pré-estabelecido, para garantir suas perfeitas condições de uso em qualquer momento. As suas sinalizações e identificações também devem ser objeto de atenção especial, tendo em vista que o ambiente agressivo do subsolo, bem como a dinâmica das operações, podem levar à sua rápida deterioração.
Acrescentamos ainda que é prudente que os eventuais equipamentos que dependam de energia elétrica tenham a sua alimentação protegida, devendo ser dotado de sistema alternativo, geralmente um sistema de baterias, que fornece a eletricidade necessária, no tempo previsto para sua operação. Esta obrigação está prevista no item 22.20.7 da NR-22, que dispõe:
22.20.7 Os equipamentos e máquinas de emergência, destinados a manter a continuidade do fornecimento de energia elétrica e as condições de segurança no trabalho, devem ser mantidos permanentemente em condições de funcionamento.
Diante de todo o exposto, verifica-se que as câmaras de refúgio possuem uma série de requisitos legais, expressamente expostos na legislação, ou que dela decorrem, a partir dos princípios que estabelecem ou conclusões interpretativas a partir das demais regras, e que podem ser resumidas no seguinte:
- Elaborar um Plano de Atendimento a Emergências (PAE) conforme a NR-22 e demais normas legais
- Incluir no PAE a definição das área de refúgio, em superfície e subsolo, inclusive as câmaras de refúgio,
- Definir no PAE em articulação com o PGR a localização das Câmaras e tempos de resistência ao fogo e de permanência das pessoas
- Possui em locais estratégicos câmaras de refúgio incombustíveis, com as características mínimas:
- porta capaz de ser selada hermeticamente;
- sistema de comunicação com a superfície;
- água potável e sistema de ar comprimido e
- ser facilmente acessíveis e identificados.
- Planejar e realizar inspeções e manutenções preventivas e corretivas, nas câmaras e seus equipamentos, sinalizações e identificações
- Garantir proteção do sistema de alimentação de energia das câmaras e contar com sistema alternativo (baterias)
Assim, pode ser complexo identificar todos estes requisitos a partir de uma leitura superficial apenas dos itens citados da norma. Por isso, é sempre importante contar com uma consultoria de requisitos legais, próxima e personalizada, realizada por especialistas confiáveis e acessíveis a qualquer momento para solucionar este tipo de dúvida, inclusive com a utilização de sistemas de gestão de requisitos legais.
Por fim, citamos outras referências normativas internacionais que se encontram abaixo que podem e devem ser consultadas como referências, uma vez que trazem disposições mais detalhadas. No entanto, não são normas obrigatórias no território brasileiro, mas servem de referência, caso seja identificado, a partir de uma avaliação de risco, a necessidade de outros requisitos específicos conforme a exigência de cada mina, como, por exemplo, câmaras de refúgio especificamente projetadas ou com recursos extras.
Outras referências normativas internacionais disponíveis em 18/08/2022:
Austrália – Refuge chambers in underground mines – guideline Resources Safety, Department of Mines and Petroleum, Western Australia, 2013, 41 p.
Canada – Mine Rescue Refuge Station Report, Workplace Safety North, Health and Safety Report , Ontario, 2016, 32 p.
Chile – Decreto nº 132/02, Aprueba Reglamento de Seguridad Minera, Ministerio de Minería, Promulgación en 30/12/2002, Última Versión de 23/02/2022, art. 100.
Estados Unidos – Federal Mine Safety & Health Act of 1977, Public Law 91-173, as amended by Public Law 95-164, Sec. 315, 1977.
Estados Unidos – Refuge Alternatives for Underground Coal Mines, Mine Safety and Health Administration, 2013, 30 CFR Parts 7 and 75, 2013, 3 p.
Inglaterra – Guidance and Information on the role and design of safe havens in arrangement for escape from mines, Health and Safe Executive (HSE), 2008, 11 p.
México – Item 8.14 “Refugios” de la Norma Oficial Mexicana, NOM-023-STPS-2012, Minas subterráneas y minas a cielo abierto – Condiciones de seguridad y salud en el trabajo, 2012, 2 p.
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